Por Izabella Corrêa
Vinte e cinco anos passados, 440 vezes mais radiação que a bomba atômica de Hiroshima, mais de seis mil casos de câncer, quatro mil mortes de crianças prematuras. Certamente esses dados permitem pensar em um assunto, mas difícil seria saber sobre eles só a partir do assunto dado, sem que fossem mencionados. É esse elemento que pesa na cobertura jornalística internacional.
Dia 26 de abril de 2011 completava-se 25 anos do acidente nuclear em Chernobyl, o mais devastador acidente dessa natureza na história humana e não vimos e nem ouvimos qualquer coisa significante sobre isso nos meios de comunicação, salvo engano, aqui e ali na internet houve tentativas de tocar na temática.
Uma pesquisa realizada pelo núcleo de assuntos internacionais da Universidade de Brasília, UnB, sobre a cobertura midiática dos temas externos ao Brasil, ajuda a argumentar sobre a ausência de falas representativas sobre Chernobyl. Para Cristina Inoue, professora responsável pela pesquisa, “a cobertura internacional de nossos veículos de informação não permite aos leitores e/ou telespectadores responder questões básicas acerca daqueles temas internacionais”. É o que verificamos nas matérias sobre os 25 anos de Chernobyl, entretanto é necessária a colocação que Chernobyl agora perde em “relevância” mundial para Fukushima, pela proximidade do evento, pela própria cobertura; ora, é mais caro ao jornalismo “hard” só falar da crise nuclear japonesa de forma pontual relacionando brevemente aos 25 anos de Chernobyl, do que recolocar em cena os aspectos do acidente, suas causas, seus personagens, o impacto no mundo, e aí então trazer à baila Fukushima e os discursos sobre a segurança da energia nuclear.
É notável que os meios têm potencialidades de complementação, o que fornece toda a justificativa para se fazer uma cobertura ampla de Chernobyl que envolva os temas atuais partindo da singularidade da data abril de 1986. Aqui é necessário dar o devido crédito a iniciativa solitária do portal da IG, “Último segundo”, que colocou algumas informações que permitem aos leitores saber mais do assunto, as características. (http://ultimosegundo.ig.com.br/ciencia/meioambiente/acidente+de+chernobyl+completa+25+anos/n1300099036837.html)
Nesse ponto, o sugerido que falta é a noção que Paul Bradshaw introduziu como a teoria do diamante na produção da notícia; faltam as etapas de maior aprofundamento, debate, e análise, no que poderia se introduzir pelas falas especializadas nas vozes de pessoas públicas, físicos nucleares, médicos e principalmente, pela busca por depoimentos de quem esteve em Chernobyl, personagens reais que vivenciaram a tragédia e, diferentemente da imprensa geral, lembram-se dela todos os dias.
Outro fator que pode ser citado é a não-cobertura in loco desses fatos, o que prejudica a compreensão de forma mais interessante. Muitos dos grandes jornais, impressos e televisivos, assim como a grande maioria dos portais na web, publicam e fazem releituras das notícias das agências internacionais, o relato do relato do relato.
Por fim, isso tudo para dizer do silenciamento da imprensa brasileira frente a um acontecimento da ordem do universal, que tem tantas implicações sentidas até hoje, que tem tantas histórias ainda não desvendadas; um acontecimento que serve de base pra se pensar muitas questões polêmicas, que carecem de debate, de reflexão informada, desde a condição do Japão, passando pelas doações para a construção do novo sarcófago em Chernobyl, até as postulações de países que vivem da energia nuclear como Alemanha e França. É esse espaço da reflexão que o jornalismo deve buscar na abordagem desses temas, e na seleção dos mesmos. Existe algo importante além do “quintal” fragmentado no qual a mídia se esconde?